Trecho do livro "Apaixonado pelo mundo" (clique aqui para comprar), mais recente lançamento de Mingyur Rinpoche:
[...] entender a impermanência como a camada exterior da morte pode ser ainda mais eficaz para cortar nossos hábitos mentais irracionais. Para que a transformação ocorra nos níveis mais profundos, não apenas reconhecemos a continuidade da mudança; reconhecemos que o processo de morte e regeneração fundamenta a verdade da impermanência. Esse é o maior encorajamento para a nossa liberação. Todavia, nosso medo da morte física nos faz resistir à ideia de morrer todos os dias. Confundimos as mortes renováveis dos nossos estados mentais com a morte definitiva do nosso corpo. Quando fazemos isso, toda forma de morte e de morrer aparecem no horizonte como um pesadelo inevitável, algo que passamos a vida desejando que não aconteça. Na verdade, com alguma investigação, podemos aprender que aquilo que mais tememos como um evento futuro está acontecendo o tempo todo.
Uma conversa que ocorreu entre duas mulheres americanas descreve essa relação íntima entre as formas de morte física e imaterial. Uma das mulheres veio me ver logo depois que seu único filho, de 20 anos, morreu após uma overdose acidental. Falamos sobre maneiras de ajudá-la a viver com essa perda trágica. Cerca de dois anos depois, a melhor amiga dessa mulher se viu passando por um divórcio muito doloroso.
A primeira explicou à amiga: meu filho nunca mais vai voltar; não alimento fantasias sobre isso. Minha relação comigo mesma e o modo como eu me relaciono com o mundo mudou para sempre. Mas o mesmo é verdadeiro para você. Sua noção de quem você é, de quem está com você e de quem seguirá com você ao longo da vida, também mudou para sempre. Você também precisa chorar uma morte. Você está pensando que tem que aceitar esta situação intolerável fora de si mesma. Mas assim como eu tive que me permitir morrer depois da morte do meu filho, você deve morrer para o casamento que já teve. Choramos não só pela morte do que tivemos, mas também por nós mesmas, pelas nossas próprias mortes. A profunda infelicidade da morte do filho dessa mulher abriu seu coração para a investigação da impermanência e da morte, indo muito além da sua própria história pessoal. Ela conseguiu ampliar seus limites, como explicou: depois que perdi meu filho, não tinha mais nada a temer. Ela transformou seu coração partido em sabedoria.