Em fevereiro de 2016, antes do lançamento do livro Além do materialismo espiritual", o querido Miguel Berredo publicou esse trechinho em seu blog "Budismo Petrópolis" (recomendo acompanhar!).
Os destaques em negrito são do próprio Miguel:
De acordo com a tradição budista, o caminho espiritual é o processo de atravessar e superar a nossa confusão, de descobrir o estado desperto da mente. Quando esse estado desperto da mente se encontra tomado pelo ego e pela paranoia que o acompanha, assume o caráter de um instinto subliminar. Dessa forma, não se trata de construir o estado desperto da mente, mas sim de extinguir as confusões que o obstruem. No processo de consumir as confusões, descobrimos a iluminação. Se o processo fosse outro, o estado desperto da mente seria um produto dependente de causa e efeito e, assim, passível de dissolução. Tudo o que é criado, mais cedo ou mais tarde, tem que morrer. Se a iluminação fosse criada dessa maneira, haveria sempre a possibilidade de o ego reafirmar-se, provocando um retorno ao estado de confusão. A iluminação é permanente porque não a produzimos – apenas a descobrimos. Na tradição budista, a analogia do Sol que surge por trás das nuvens é frequentemente empregada para explicar a descoberta da iluminação. Na prática de meditação, removemos a confusão do ego a fim de vislumbrar o estado desperto. A ausência da ignorância, da sensação de opressão, da paranoia, descortinam uma visão fantástica da vida. Descobrimos um modo diferente de ser.
O cerne da confusão é o fato de o homem ter um senso de ego que lhe parece contínuo e sólido. Quando ocorre um pensamento, uma emoção ou um evento, há o sentido de que alguém tem consciência do que está acontecendo. Você sente que você está lendo estas palavras. Esse senso de eu, na realidade, é um evento transitório e descontínuo que, em nossa confusão, parece perfeitamente estável e contínuo. Como tomamos por real a nossa visão confusa, lutamos para manter e incrementar esse eu sólido. Tentamos alimentá-lo com prazeres e escudá-lo contra a dor. Continuamente, a experiência ameaça revelar-nos a nossa transitoriedade, de modo que estamos sempre lutando para encobrir qualquer possibilidade de descoberta da nossa verdadeira condição. Poderíamos perguntar: "Mas, se a nossa verdadeira condição é um estado desperto, por que nos ocupamos tanto em evitar tomar consciência disso?" Por estarmos tão imersos em nossa visão de mundo confusa, nós a consideramos real, o único mundo possível. Essa luta por manter o senso de um eu sólido e contínuo é obra do ego.
O ego, contudo, não é completamente bem-sucedido em sua tentativa de nos defender do sofrimento. É a insatisfação que vem junto com a luta do ego que nos inspira a examinar o que estamos fazendo. E, como sempre existem hiatos na consciência que temos de nós mesmos, torna-se possível algum discernimento.
O Eduardo Pinheiro (Padma Dorje) publicou um texto fantástico sobre esse livro no nosso Medium. Confira
aqui.
Abaixo, um link para ir à página do livro.